Mar não me disseste ao ouvido que vinhas com tempestade
o embate estilhaçou a minha barcaça
não contava com os ventos traiçoeiros
nem com as gaivotas esfomeadas a picarem-me a pele.
Mar ondulado enfraqueceste-me com enjoos
secaste-me a garganta com o teu sal
empurraste-me borda fora
obrigaste-me a naufragar e agora?
Meu amante meu calmante não encontro berço na tua maré.
Quis molhar os pés e a tua água estava gelada
mergulhei e engoli tanta água
cuspi arranhei a traqueia magoei o coração
não encontro refúgio nem embalo não encontro salvação.
Não me disseste ao ouvido que a tua água estava turva
como naqueles dias de vento
dias encobertos em que começa a chover.
Pensava submersa em teus braços que nunca me farias mal
que da tua escuridão não sairia nenhum desgosto
nenhum monstro nenhum tubarão.
[corro para ti e mergulho
abro os olhos e não consigo ver nada
mete medo dar mais uma braçada
mete medo encher o peito de ar].
[Prossigo envolta na tua água
abandonando-me em direcção ao negro
sem me preocupar com o ar que me resta
a pensar no dia em que vou fechar os olhos em ti
como quando boiamos completamente entregues]
23 de Julho 2014. Faro, Praia.